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SAÚDE MENTAL E TRABALHO

  • Foto do escritor: Psicº. Alan Müller
    Psicº. Alan Müller
  • 9 de nov. de 2018
  • 3 min de leitura

Reflexão sobre Psicologia e Prática.



O presente artigo almeja elucidar de forma sucinta as relações indissociáveis entre saúde mental e trabalho, refletindo o modelo de atuação da Psicologia no contexto político, social e histórico no qual ela está inserida.


Com o advento da Revolução industrial e do capitalismo inicia-se o período denominado modernidade o qual para Bauman (2001, p.132) caracterizava-se por sua consistência pesada e enraizada, tendo a conquista territorial e seus derivados como fator catalisador das relações de poder. Ortega y Gasset (1993, p.33) salienta que esta modernidade era pautada em ideais progressistas, apregoando a ideia de que as demais eras não passavam de uma preparação para a atual, acreditando em uma espécie de evolução histórica natural, ou seja, a humanidade caminhava para um bem-estar utópico. O tempo provou que tais vislumbres eram infundados e os resquícios de tais ações políticas e formas de perceber a realidade causam ainda inúmeras sequelas nas relações humanas, principalmente no que tange o fenômeno trabalho, gerando assim malefícios a saúde do sujeito.


A modernidade pesada citada por Bauman passa a ceder espaço para uma pós-modernidade caracterizada antagonicamente pela leveza, pela liquidez. Neste panorama entende-se a instantaneidade da atualidade, assim como a fluidez das atividades políticas, dos valores, e até mesmo do tempo, como os alicerces das relações humanas. Esta instantaneidade transformou severamente a constituição da sociedade contemporânea, principalmente os relacionamentos na esfera do trabalho.


Sendo “o trabalho um objeto de estudo necessário para se compreender o fenômeno psicológico” (CODO; SORATTO; VASQUES-MENEZES, 2004, p.277) inserido nesta realidade fluída e imediatista, a prática psicológica necessita estar fundamentada em uma perspectiva que vise o trabalho como uma parte basilar da construção do sujeito. Esta concepção deve ser centrada na dimensão humanizante do trabalho, dado que este nos possibilita compreender o ser humano. Todavia, algumas práxis psicológicas acabam por limitar a relação do trabalho quanto à estruturação da subjetividade, sendo em algumas vezes radicalmente realistas (focando o ambiente) ou inversamente idealistas (considerando apenas o subjetivo). Faz-se necessário transpor tais perspectivas teóricas buscando um viés que faça uma relação direta com a realidade, para que não se recaía no estigma do psicologismo.


A Ergonomia da Atividade tem muito a contribuir neste panorama complexo. Fugindo de pensamentos deterministas ela busca “estudar a mediação indivíduo-trabalho-ambiente” (FERREIRA, 2003 apud FERREIRA; ALMEIDA; GUIMARÃES, 2013, p.571). Objetivando a qualidade de vida no trabalho, esta abordagem separa-se do assistencialismo, assim como do materialismo da escola americana para trabalhar de forma dialética, tendo a atividade do trabalhador como seu eixo principal. Almeja-se desta forma minimizar o adoecimento no universo do trabalho, causado por fatores diversos.


A Psicologia compreendida por esta óptica vislumbrará um ser humano que é trespassado continuamente pela esfera do trabalho em sua constituição. Dito isto, ressalta-se a relevância da significação do trabalho para o individuo e suas consequências em todas as áreas da vida do mesmo. Para Antunes,


Uma vida cheia de sentido fora do trabalho supõe uma vida dotada de sentido dentro do trabalho. Não é possível compatibilizar trabalho assalariado, fetichizado e estranhado com tempo (verdadeiramente) livre. Uma vida desprovida de sentido no trabalho é incompatível com uma vida cheia de sentido fora do trabalho. ( 2010, p.112)

Caso o trabalho não seja compreendido como detentor de tal importância no universo de construção do sujeito contemporâneo, inserido nesta sociedade pós-moderna instantânea e fluida, corre-se o risco da prática psicológica tornar-se uma instigadora do adoecimento ao invés de sua nêmese. Em outras palavras, pode transmutar-se de facilitadora para uma espécie de chicote industrial moderno, passando a reduzir o humano quando deve humaniza-lo. O reducionismo tende a extirpar a integralidade do homem, e o mesmo vale para a própria questão do trabalho. Como mencionado anteriormente, este é uma das partes constitutivas da vida do homem contemporâneo, e não a única. Deve-se contextualizar o sujeito em sua total multiplicidade, pois a vida humana é drama complexo e multifatorial.


Gentiliza entrar em contato em caso de dúvidas ou sugestões.

Um grande abraço.


REFERÊNCIAS

ANTUNES, Ricardo. Adeus ao Trabalho?: ensaios sobre a metamorfose e a centralidade do mundo do trabalho. 14.ed. São Paulo: Cortez, 2010.

BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2001.

CODO; SORATTO; VASQUES-MENEZES. Saúde Mental e Trabalho. In: ZANELLI, José Carlos; BASTOS, Antonio Virgílio Bittencourt; BORGES- ANDRADE, Jairo Eduardo. Psicologia, organizações e trabalho no Brasil. Porto Alegre: Artmed, 2004.

FERREIRA; ALMEIDA; GUIMARÃES. Ergonomia da Atividade: Uma Alternativa Teórico-Metodológica no Campo da Psicologia Aplicada aos Contextos de Trabalho. In: BORGES, Lívia de oliveira; MOURÃO, Luciana (Orgs). O trabalho e as Organizações: atuações a partir da psicologia. Porto Alegre: Artmed, 2013.

ORTEGA Y GASSET, José. The Revolt of the Masses. Nova York: W.W. Norton & Company, 1993.


Autor: Alan é Psicólogo (CRP-12/15759), atuando com psicologia clínica na cidade de Brusque - SC; Além disto é Escritor, Mestrando em Psicologia Clínica pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), graduado em Psicologia pela UNIFEBE, com ênfase em Prevenção e Promoção de Saúde, e graduado em História pela Universidade Paulista. Membro ativo do Laboratório de Fenomenologia e Subjetividade (LabFeno) da UFPR.

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Alan Müller

Psicólogo (CRP-12/15759)

Isabel Fuchs Müller

Psicóloga (CRP-12/10588)

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